Interação Social: A importância de construir vínculos positivos na infância


11/09/2019 - Atualizado em 12/09/2019 - 2139 visualizações

Vivemos numa época em que as relações sociais estão se transformando. O uso da tecnologia, como ferramenta de comunicação, facilitou imensamente nosso dia a dia. E, da mesma forma que permitiu a aproximação entre as pessoas, também fez com que muitas relações se pautassem na intermediação de um aparelho eletrônico. Hoje é possível encontrar duas pessoas num mesmo ambiente que ao invés de conversarem ao vivo, trocam mensagens pelo aplicativo de conversa.

No entanto, segundo a educadora Fernanda Mello de Moura, técnica de Educação do Sesc-SC, esse fato está causando um distanciamento na construção de vínculos afetivos. “Não há mais troca de olhares e as demonstrações de emoções, que originalmente se davam pela expressão corporal, estão perdendo espaço para as telas”, identifica.

Para ela, o perigo desta situação é deixarmos as crianças se habituarem a manter relações que não envolvem uma conexão real, mas que sejam frias e artificiais. “Quando interagimos, olhando para o outro, podemos perceber suas reações e sentimentos, o que nos permite criar vínculos emocionais. Assim, há maior facilidade em desenvolvermos a empatia e o altruísmo”, considera Fernanda.

Uma base afetiva forte e a ligação profunda entre os membros familiares ajuda as crianças a lidarem com seus sentimentos, bons e ruins, bem como diminui a probabilidade do surgimento de depressões e outros problemas. “A partir do momento em que há a validação das suas emoções e apoio constante, as crianças crescem mais seguras, pois entendem o que sentem e como são importantes para seus familiares”. Para aprofundar o assunto, conversamos com a educadora Gilvania Ferreira Porto, da gerência de Educação do Departamento Nacional do Sesc. Ela falou sobre família, rede de amizades, convívio social, a relação do uso da tecnologia com problemas emocionais, entre outros aspectos relacionados ao assunto. Segundo ela, “construir vínculos de afeto com as pessoas do seu convívio é fundamental para a construção da identidade”.

Confira abaixo a entrevista completa:

Blog Sesc: Qual a importância da relação afetiva da criança com os familiares (avós, tios, pai, mãe)?

Gilvania Ferreira Porto: Construir vínculos afetivos na infância, que acolham e aproximem as crianças dos valores importantes para a família é uma experiência fundamental para que as crianças se tornem adultos seguros e que consigam resolver conflitos.

É o adulto (avós, tios, pai, mãe) que vai construindo, paulatinamente, as primeiras regras de convívio social das crianças. Neste sentido, é importante ir construindo acordos com as crianças, é o adulto que dá o tom do que se pode ou não se pode fazer. Criar crianças sem limites claros de convivência, pode favorecer que cresçam sem respeito ao lugar do outro, aos sentimentos do outro, a não se solidarizar com o que os amigos e conhecidos vivem e sentem.

Na família construímos laços de afeto, respeito, solidariedade. Aprendemos também brincadeiras da nossa tradição oral, que passam de geração para geração. Privar as crianças do convívio com seus familiares é um risco de criar crianças sem laços de amor e de afeto.

Por que é importante uma criança ter convívio com os avós?

Gilvania: Os avós são a memória viva da história da família, aprendemos com eles a fazer pratos tradicionais que passam de geração para geração, as histórias da família, as crendices, as receitas caseiras para os males, e tantos outros vínculos de afeto, memória e história. Os avós nos acolhem e nos incentivam a fazer muitas descobertas. Avós e netos sabem coisas diferentes sobre a vida e ambos aprendem nesta relação. É importante para os avós terem seus netos por perto, isso também os fortalecem, voltam a se responsabilizar por aspectos importantes para o funcionamento da família, se sentem necessários e amados. Mas é importante também lembrar que, na atualidade, temos muitos avós jovens, que ainda estão no mercado de trabalho, e que contribuem com seus netos na qualidade do tempo que dispõe para eles. De qualquer forma, todos ganham nesta relação!

Na contemporaneidade, as famílias são compostas por um único filho. O que é possível fazer para que essa criança não se sinta sozinha?

Gilvania: Estabelecer uma rede de amigos que tenham filhos, em idades iguais ou próximas do seu filho, pode ser uma saída. Integrar-se aos amigos da escola também, criando grupos de convivência é uma outra possibilidade. Combinar programas de final de semana com eles, programas direcionados à infância: uma ida ao parque, a uma praça, ao clube, a praia, ao jardim botânico, para pedalar, patinar, fazer um piquenique, brincar de pular elástico ou corda, de jogar bola, lembrar das brincadeiras que gostava de fazer em sua infância, com seus amigos e parentes pode ser um bom começo para viver a experiência com seus filhos.

Qual a relação do uso da tecnologia com problemas emocionais desenvolvidos precocemente pelas crianças?

Gilvania: As crianças têm ficado um longo tempo do dia usando computadores, tablets e smartphones. Pesquisas já indicam que este tempo, solitário, dedicado ao uso excessivo de equipamentos tecnológicos, tem acarretado nas crianças irritabilidade, falta de atenção, cansaço... além disso ficam muito tempo sozinhas, e não conseguem desenvolver habilidades de convívio social. Precisam estar todo o tempo com o aparelho na mão para que possam se comportar adequadamente em espaços públicos. Na escola, tem dificuldade de dividir o espaço e os brinquedos, de focar a atenção em atividades que exigem o uso do seu corpo.

Não há como deixar as crianças longe destes aparelhos, nasceram neste contexto midiático. Mas é possível restringir e limitar o uso. E oferecer às crianças outros tipos de materiais que poderão auxiliá-las no desenvolvimento, como os jogos de tabuleiro, os livros de literatura, brinquedos da cultura local, como pipa, peão, bola de gude, bonecas de pano, dentre outros. Construir brinquedos com as crianças utilizando materiais reaproveitados, aprender a brincar com seus filhos com as brincadeiras que também brincava quando era criança, conhecer novas brincadeiras com outras crianças.

Como a interação social está sendo afetada pelo aumento do uso de aparelhos eletrônicos?

Gilvania: As relações mudaram. Hoje é possível encontrar duas pessoas num mesmo ambiente que ao invés de conversarem ao vivo, trocam mensagens pelo aplicativo de conversa. É preciso romper com esta prática e criar situações nas quais a interação seja de fato social, em que o olho no olho, a conversa franca, cuidadosa e amorosa possa acontecer. Construir vínculos de afeto com as pessoas do seu convívio é fundamental para a construção da identidade dos sujeitos.

Qual a importância de parques públicos, o brincar na natureza e o convívio com crianças com síndromes e deficiências para a interação social?

Gilvania: O mundo é diverso. As pessoas são diversas. Antes éramos privados de olhar para as pessoas com algum tipo de síndrome ou deficiência, porque estas pessoas também eram privadas do convívio. O que aprendemos, muito pouco sobre diferenças! Adultos da minha geração não sabem lidar com o diferente, tem pouca tolerância aos ritmos de outras pessoas.

Brincar é uma das atividades diárias para as crianças mais importantes. Ao brincar, estabelecem vínculos com seus pares, aprendem a dialogar, a resolver conflitos, a respeitar quem pensa diferente, a ter atitudes solidárias, constroem normas de comportamento, a ceder, a cooperar, a ser organizadas. Também aprendem a correr, a seguir e a chutar uma bola, a ter equilíbrio, a brincar com elementos naturais e a nadar; o que é importante para o seu desenvolvimento físico e intelectual.

Os parques públicos, os espaços abertos, em contato com a diversidade de natureza que temos em nossas cidades, favorece às crianças aprender a lidar com o desconhecido, a avaliar quais habilidades já desenvolveu para enfrentar alguns desafios, como subir em uma árvore, enfrentar a onda do mar na beira da praia, a subir um degrau ou em um toco de árvore cortada. As crianças precisam aprender a fazer escolhas, para que desenvolvam autonomia. O adulto pode mediar esta relação, mas no sentido de incentivá-las a enfrentar os riscos e ajudando-as a perceber quais poderão ser enfrentados. Cair, se machucar e levantar.

Entre um tombo e outro, a criança cria resistência para lidar com o mundo. É claro que as crianças precisam do olhar atento do adulto, mas é importante que as auxiliemos a avaliar o que é possível viver ou não nos espaços em contato com a natureza, Richard Louv destaca que “O medo do risco por seus filhos é compreensível, temos que proteger nossos filhos. Mas se queremos que cresçam e virem adultos resilientes e estejam seguros, eles têm que correr riscos na infância”.

Acompanhe a série "Educação Afetiva":



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